A Inteligência não é o Fundo do nosso Ser
A inteligência não é o fundo do nosso ser. Pelo contrário. É como uma pele sensível, tentacular que cobre o resto do nosso volume íntimo, o qual por si é sensu stricto ininteligente, irracional. Barrès dizia isto muito bem: L’intelligence, quelle petite chose à la surface de nous. Aí está ela, estendida como um dintorno sobre o nosso ser mais interior, dando uma face às coisas, ao ser – porque o seu papel não é outro senão pensar as coisas, pensar o ser, o seu papel não é ser o ser, mas reflecti-lo, espelhá-lo. Tanto não somos ela que a inteligência é uma mesma em todos, embora uns dela tenham maior porção que outros. Mas a que tiverem é igual em todos: 2 e 2 são para todos 4. Por isso Aristóteles e o averroísmo acreditaram que havia um único noûs ou intelecto no Universo, que todos éramos, enquanto inteligentes, uma só inteligência. O que nos individualiza está por trás dela.
Mas não vamos agora espicaçar uma tão difícil questão. Baste o que foi dito para sugerir que em vão pretenderá a inteligência lutar num match de convicção com as crenças irracionais, habituais. Quando um cientista sustém as suas ideias com uma fé semelhante à fé vital,
Textos sobre Inteligência
193 resultadosQuem tem muita experiência fala com inteligência
Quem tem muita experiência fala com inteligência.
Inteligência e Intuição
O instinto é simpatia. Se esta simpatia pudesse alargar o seu objecto e também reflectir sobre si mesma, dar-nos-ia a chave das operações vitais – do mesmo modo que a inteligência, desenvolvida e reeducada, nos introduz na matéria. Porque, não é de mais repeti-lo, a inteligência e o instinto estão orientados em dois sentidos opostos: aquela para a matéria inerte, este para a vida. A inteligência, por meio da ciência, que é obra sua, desvendar-nos-á cada vez mais completamente o segredo das operações físicas; da vida apenas nos dá, e não pretende aliás dar-nos outra coisa, uma tradução em termos de inércia. Gira em derredor, obtendo de fora o maior número de visões do objecto que chama até si, em vez de entrar nele. Mas é ao interior mesmo da vida que nos conduzirá a intuição, quero dizer o instinto tornado desinteressado, consciente de si mesmo, capaz de reflectir sobre o seu objecto e de o alargar indefinidamente.
Que um esforço deste género não é impossível, é o que demonstra já a existência no homem de uma faculdade estética ao lado da percepção normal. O nosso olhar apercebe os traços do ser vivo, mas justapostos uns aos outros, e não organizados entre si.
Conhecimento Interesseiro
Conhecer uma realidade é, no sentido habitual do termo «conhecer»: tomar conceitos já feitos, doseá-los, combiná-los até obter um equivalente prático do real. Mas não se deve esquecer que o trabalho da inteligência está longe de ser um trabalho desinteressado. Não visamos em geral conhecer por conhecer, mas conhecer para tomar uma decisão, para tirar algum proveito; enfim, para satisfazer algum interesse.
Viver Plenamente os Desejos
Quanto ao facto de saber se o sexual e o religioso são antagónicos e opostos, eu responderia do seguinte modo: todos os elementos ou aspectos da vida, por muito pobres, por muito duvidosos que sejam (para nós), são susceptíveis de conversão, e na verdade devem ser transpostos para outro nível, de acordo com a nossa maturidade e inteligência.O esforço visando eliminar os aspectos «repugnantes» da existência, que é a obsessão dos moralistas, não só é absurdo, como fútil. É possível ser-se bem sucedido na repressão dos pensamentos e desejos, dos impulsos e tendências feios e «pecaminosos». mas os resultados são manifestamente desastrosos. (É estreita a margem que separa um santo e um criminoso). Viver plenamente os seus desejos e, ao fazê-lo, modificar subtilmente a natureza destes, é o objectivo de todo o indivíduo que aspira a desenvolver-se. Mas o desejo é soberano e inextirpável, mesmo quando, como dizem os budistas, se converte no seu contrário. Para alguém se poder libertar do desejo, tem que desejar fazê-lo.
A Tirania Individual e a Tirania Colectiva
As divergências de opinião não resultam, como por vezes supomos, das desigualdades de instrução daqueles que as manifestam. Elas notam-se, com efeito, em indivíduos dotados de inteligência e de instrução equivalentes. Disso se convencerá quem percorrer as respostas aos grandes inquéritos colectivos destinados a elucidar certas questões bem definidas.
Entre os inúmeros exemplos fornecidos pela leitura das suas actas, mencionarei apenas um, muito típico, publicado nos Anais de Psicologia do sr. Binet. Querendo informar-se quanto aos efeitos da redução do programa de história da filosofia nos liceus, enviou um questionário a todos os professores incumbidos desse ensino. As respostas foram nitidamente contraditórias, pois uns declaravam desastroso o que os outros julgavam excelente. «Não se compreende», conclui o Sr. Binet com melancolia, «que uma reforma que consterna um professor, pareça excelente a um dos seus colegas. Que lição para eles sobre a relatividade das opiniões humanas, mesmo entre pessoas competentes!».
Contradições da mesma espécie invariavelmente se manifestaram em todos os assuntos e em todos os tempos. Para chegar à acção, o homem teve, entretanto, de escolher entre essas opiniões contrárias. Como operar tal escolha, sendo a razão muito fraca para a determinar?
Somente dois métodos foram descobertos até hoje: aceitar a opinião da maioria ou a de um único,
Sem Acção, de Nada Vale a Inteligência
Os conhecimentos ouvem-se, mas para agir a capacidade de audição é praticamente desprezável. Porque agir é estar próximo das coisas e ouvir é estar afastado das coisas. Alguém que apenas ouve será considerado um intruso no mundo, a Natureza não se sentirá ameaçada. Quem ouve poderá acumular conhecimentos, mas essa acumulação não lutará com a Natureza. Esta resiste bem à inteligência, ao raciocínio e à memória do Homem: todas estas qualidades intelectuais são assuntos que dizem respeito exclusivamente ao mundo da cidade, e o que ameaça a Natureza são as acções: os momentos em que os humandos abandonam a audição, e mesmo a linguagem do discurso, e passam a querer falar com o tacto: o único que pode alterar as coisas.
Se os homens, mantendo a sua inteligência incorrupta, fossem seres imóveis, incapazes de qualquer movimento, seriam ainda hoje menos poderosos do que um único metro quadrado de terra espontâneo. Poderiam possuir um grau de aperfeiçoamento no pensamento abstracto, matemático e lógico, mas não deixariam de ser uma espécie secundária ao lado das outras: as possuidoras de movimento. Qualquer cão mesquinho mijaria nas pernas de um homem inteligente, mas imóvel.Gonçalo M.
Sobre o Falso
Somos falsos de maneiras diferentes. Há homens falsos que querem parecer sempre o que não são. Outros há de melhor fé, que nasceram falsos, se enganam a si próprios o nunca vêem as coisas tal como são. Há alguns cujo espírito é estreito e o gosto falso. Outros têm o espírito falso, mas alguma correcção no gosto. E ainda há outros que não têm nada de falso, nem no gosto nem no espírito. Estes são muito raros, já que, em geral, não há quase ninguém que não tenha alguma falsidade algures, no espírito ou no gosto.
O que torna essa falsidade tão universal, é que as nossas qualidades são incertas e confusas e a nossa visão também: não vemos as coisas tal como são, avaliamo-las aquém ou além do que elas valem e não as relacionamos connosco da forma que lhes convém e que convém ao nosso estado e às nossas qualidades. Esse erro de cálculo traz consigo um número infinito de falsidades no gosto e no espírito: o nosso amor-próprio lisonjeia-se como tudo que se nos apresenta sob a aparência de bem; mas como há várias formas de bem que sensibilizam a nossa vaidade ou o nosso temperamento,
O Homem Deveria ser a Medida de Tudo
O homem deveria ser a medida de tudo. De facto, ele é um estranho no mundo que criou. Não soube organizar este mundo para ele, porque não possuía um conhecimento positivo da sua própria natureza. O enorme avanço das ciências das coisas inanimadas em relação às dos seres vivos é, portanto, um dos acontecimentos mais trágicos da história da humanidade. O meio construído pela nossa inteligência e pelas nossas intenções não se ajusta às nossas dimensões nem à nossa forma. Não nos serve. Sentimo-nos infelizes. Degeneramos moralmente e mentalmente.
São precisamente os grupos e as nações em que a civilização industrial atingiu o apogeu que mais enfraquecem. Neles, o retorno à barbárie é mais rápido. Permanecem sem defesa perante o meio adverso que a ciência lhes forneceu. Na verdade, a nossa civilização, tal como as que a antecederam, criou condições em que, por razões que não conhecemos exactamente, a própria vida se torna impossível. A inquietação e a infelicidade dos habitantes da nova cidade têm origem nas instituições políticas, económicas e sociais, mas sobretudo na sua própria degradação. São vítimas do atraso das ciências da vida em relação às da matéria.
A Sabedoria do Corpo
Tu dizes «eu» e orgulhas-te desta palavra. Mas há qualquer coisa de maior, em que te recusas a aceditar, é o teu corpo e a sua grande razão; ele não diz Eu, mas procede como Eu.
Aquilo que a inteligência pressente, aquilo que o espírito reconhece nunca em si tem o seu fim. Mas a inteligência e o espírito quereriam convencer-te que são o fim de todas as coisas; tal é a sua soberba.
Inteligência e espírito não passam de instrumentos e de brinquedos; o Em si está situado para além deles. O Em si informa-se também pelos olhos dos sentidos, ouve também pelos ouvidos do espírito.
O Em si está sempre à escuta, alerta; compara, submete; conquista, destrói. Reina, e é também soberano do Eu.
Por detrás dos teus pensamentos e dos teus sentimentos, meu irmão, há um senhor poderoso, um sábio desconhecido: chama-se o Em si. Habita no teu corpo, é o teu corpo.
Há mais razão no teu corpo do que na própria essência da tua sabedoria.
Génio, Talento e Celebridade
Pode-se supor que a presença no mesmo homem de mais de um elemento intelectual facilitaria a sua imediata celebridade. Até certo limite é assim, mas o é até um limite menor do que se poderia conjecturar na ociosidade da hipótese. Um homem dotado ao mesmo tempo de grande génio e de grande inteligência (como Shakespeare), ou de grande génio e grande talento (como Milton), não acumula na sua época ou na seguinte os resultados do génio e os resultados de outra qualidade. É que estes diferentes elementos intelectuais estão misturados por coexistirem no homem, e derrama-se na substância da inteligência ou do talento o sagrado veneno do génio; a bebida é amarga, embora retenha algo do seu gosto comum. Os antigos misturavam mel com vinho e achavam isso gostoso; mas o néctar não pode fazer qualquer vinho gostoso ao paladar da gente comum.
Um homem que pudesse ter em si próprio, em certo grau, génio, talento e inteligência, estaria preparado para produzir impacto no seu tempo pela sua inteligência, na sua época pelo seu talento e na generalidade dos futuros tempos e épocas pelo seu génio. Mas como o seu génio afectaria o seu talento e o seu talento e o seu génio a sua inteligência –
A Melhor Parte da Nossa Memória está Fora de Nós
As recordações em amor não constituem uma excepção às leis gerais da memória, também ela regida pelas leis do hábito. Como esta enfraquece tudo, o que mais nos faz lembrar uma pessoa é justamente aquilo que havíamos esquecido por ser insignificante e a que assim devolvemos toda a sua força.
A melhor parte da nossa memória está deste modo fora de nós. Está num ar de chuva, num cheiro a quarto fechado ou no de um primeiro fogaréu, seja onde for que de nós mesmos encontemos aquilo que a nossa inteligência pusera de parte, a última reserva do passado, a melhor, aquela que, quando se esgotam todas as outras, sabe ainda fazer-nos chorar.
Você não necessita de inteligência para ter sorte, mas necessita de sorte para ser inteligente.
A Guerra é Deus
Pouco interessa o que os homens pensam da guerra, disse o juiz. A guerra perdura. É o mesmo que perguntar-lhes o que acham da pedra. A guerra sempre esteve presente. Antes de o homem existir, a guerra já estava à espera dele. O ofício supremo a aguardar o seu supremo artífice. Sempre foi assim e sempre assim será. Assim e não de outra forma.
(…) Os homens nasceram para jogar. Nada mais. Todo o garoto sabe que a brincadeira é uma ocupação mais nobre do que o trabalho. Sabe também que a excelência ou mérito de um jogo não é inerente ao jogo em si, mas reside, isso sim, no valor daquilo que os jogadores arriscam. Os jogos de azar exigem que se façam apostas, sem o que não fazem sequer sentido. Os desportos implicam medir a destreza e a força dos adversários e a humilhação da derrota e o orgulho da vitória constituem em si mesmos aposta suficiente, pois traduzem o valor dos contendores e definem-nos. Porém, quer se trate de contendas cuja sorte se decide pelo azar quer pelo mérito, todos os jogos anseiam elevar-se à condição da guerra, pois nesta aquilo que se aposta devora tudo,
As Leis Naturais não se Vergam aos Nossos Desejos
A dignidade da inteligência está em reconhecer que é limitada e que o universo está fora dela. Reconhecer, com desgosto próprio ou não, que as leis naturais se não vergam aos nossos desejos, que o mundo existe independentemente da nossa vontade, que o sermos tristes nada prova sobre o estado moral dos astros, ou até do povo que passa pelas nossas janelas: nisto está o vero uso da razão e a dignidade racional da alma.
Álvaro
… Diabo de homem, este Álvaro… Agora chama-se Álvaro de Silva… Vive em Nova Iorque… Passou quase toda a vida na selva nova-iorquina… Imagino-o a comer laranjas a horas insólitas, queimando com o fósforo o papel dos cigarros, fazendo perguntas vexatórias a toda a gente… Foi sempre um mestre desordenado, possuidor de uma brilhante inteligência, inteligência inquiridora que parecia não o levar a pparte nenhuma, excepto a Nova Iorque. Era em 1925…
Entre as violetas que se lhe escapavam da mão quando corria para as entregar a uma transeunte desconhecida, com a qual queria logo ir deitar-se, sem saber como ela se chamava nem donde era, e as suas intermináveis leituras de Joyce, revelou-me a mim e a muitos outros insuspeitadas opiniões, pontos de vist-a de grande cidadão que vive dentro da urbe, na sua cova, e sai a explorar a música, a pintura, os livros, a dança… Sempre a comer laranjas, a descascar maçãs, insuportável dietético, assombrosamente intrometido em tudo, víamos nele, por fim, o sonhado antiprovinciano que todos nós, os provincianos, tínhamos querido ser, sem as etiquetas coladas nas malas, antes circulando dentro de si próprio, com uma mistura de países e concertos, de cafés ao alvorecer,
Sensibilidade no Tom Certo
Quanto mais aprofundamos, com a vida, a própria sensibilidade, mais ironicamente nos conhecemos. Aos 20 anos eu cria no meu destino funesto; hoje conheço o meu destino banal. Aos 20 anos aspirava aos Principados do Oriente; hoje contentar-me-ia, sem pormenores nem perguntas, com um fim da vida tranquilo aqui nos subúrbios, dono de uma tabacaria vagarosa.
O pior que há para a sensibilidade é pensarmos nela, e não com ela. Enquanto me desconheci ridículo, pude ter sonhos em grande escala. Hoje que sei quem sou, só me restam os sonhos que delibero ter.
(…) O ridículo é o couce da inteligência; há muito que da inteligência não possuo senão o couce.
Se faço estas análises de um modo lasso e casual, não é senão porque assim retrato mais o que sou. De uma análise propriamente profunda não só sou incapaz, mas sou também artista demais para a pensar em fazer; pensar em fazê-la seria pensar em dar de mim a ideia de que sou uma criatura disciplinada e coerente, quando o que sou é um analisador disperso e subtilmente desconcentrado. A minha arte é ser eu. Eu sou muitos. Mas, com o ser muitos, sou muitos em fluidez e imprecisão.
Saber Ouvir os Outros
Saber ouvir não é deixar cair a cabeça em concordância com tudo o que é dito nem é ficar estupefacto e inexpressivo enquanto o outro fala, é sim, e pelo contrário, perceber se quem se dirige a ti quer informar-te, partilhar ou desafiar-te sobre alguma questão a teu próprio respeito ou simplesmente apoderar-se da tua mente para tornar a sua mais forte com o intuito de te conseguir manipular a seu bel-prazer.
Consegues fazer a destrinça entre estes dois tipos de pessoas? E-te fácil distinguir um do outro?
Consegues identificar duas pessoas com quem recentemente tenhas conversado e com quem tenhas sentido realidades tão ambíguas como estas?
O que sentiste após cada conversa?
Agradeceste ao primeiro e expulsaste o segundo da tua vida ou culpaste o primeiro e resignaste-te perante o segundo?É fundamental que consigas aperceber-te disto e é por isso que a inteligência emocional é um requisito tão importante para quando somos os recetores da verdade ou do ego de quem se dirige a nós. Nunca te esqueças do seguinte: independentemente daquilo que te possam dizer, és tu que permites que essa pessoa continue a fazer parte da tua vida, és tu que te pões a jeito porque levas essa pessoa demasiado a sério,
A Fronteira entre a Inteligência e o Dogma
A função própria da inteligência exige uma liberdade total, implicando o direito a tudo negar e nenhuma dominação. Sempre que ela usurpa um comando, há excesso de individualismo. Sempre que se encontra tolhida, há uma colectividade opressiva, ou várias.
A Igreja e o Estado devem puni-la, cada um à sua maneira, quando ela aconselha actos que eles desaprovam. Quando ela permanece no campo da especulação puramente teórica, eles têm ainda o dever, se for caso disso, de pôr o público de sobreaviso, por todos os meios eficazes, contra o perigo de uma influência prática de certas especulações na condução das vidas. Mas, sejam quais forem essas especulações teóricas, Igreja e Estado não têm o direito nem de procurar abafá-las nem de inflingir aos seus autores quaisquer danos materiais ou morais.
Em especial, não se deve privá-los dos sacramentos se estes os desejarem. Porque, seja o que for que tenham dito, mesmo que tenham negado publicamente a existência de Deus, é possível que não tenham cometido qualquer pecado. Em tal caso, a Igreja deve declarar que se encontram em erro, mas não exigir deles seja o que for que se assemelhe a um desmentido do que afirmaram, nem privá-los do pão da vida.
A Alegoria da Caverna
– Imagina agora o estado da natureza humana com respeito à ciência e à ignorância, conforme o quadro que dele vou esboçar. Imagina uma caverna subterrânea que tem a toda a sua largura uma abertura por onde entra livremente a luz e, nessa caverna, homens agrilhoados desde a infância, de tal modo que não possam mudar de lugar nem volver a cabeça devido às cadeias que lhes prendem as pernas e o tronco, podendo tão-só ver aquilo que se encontra diante deles. Nas suas costas, a certa distância e a certa altura, existe um fogo cujo fulgor os ilumina, e entre esse fogo e os prisioneiros depara-se um caminho dificilmente acessível. Ao lado desse caminho, imagina uma parede semelhante a esses tapumes que os charlatães de feita colocam entre si e os espectadores para esconder destes o jogo e os truques secretos das maravilhas que exibem.
– Estou a imaginar tudo isso.
– Imagina homens que passem para além da parede, carregando objectos de todas as espécies ou pedra, figuras de homens e animais de madeira ou de pedra, de tal modo que tudo isso apareça por cima do muro. Os que tal transportam, ou falam uns com os outros,