Foram-se, há muito, os vinte anos, a época das análises, das complicadas dissecações interiores. Compreendi por fim que nada compreendi, que mesmo nada poderia ter compreendido de mim. Restam-me os outros… talvez por eles possa chegar às infinitas possibilidades do meu ser misterioso, intangível, secreto.
Passagens sobre Época
228 resultadosAs ideias dominantes de uma época sempre foram as ideias da classe dominante.
A Actualidade em Poesia
Uma coisa é poesia actual, outra coisa é actualidade em poesia. A actualidade em poesia compreende um tempo específico, que não só não é o tempo subordinado ao espaço no qual o poeta se move, como até entra em conflito com este.
Fazer poesia actual não é escrever versos destinados a terem êxito na actualidade representada pelo público e pela critica, porque esta é o atraso de um tempo de que o poeta é o avanço. Suspeito é o poeta sempre que agradavelmente afeiçoa os seus versos a uma comum sensibilidade literária. Não estou fazendo o elogio da poesia obscura ou ambiciosamente original. O gosto literário de uma época pode ser precisamente a obscuridade e a originalidade. É o que acontece com a nossa. E neste caso originalidade como recurso é poeticamente estéril, porque não fascina mas apenas satisfaz. Nada menos original do que a acomodatícia originalidade da poesia dos nossos dias e também nada menos actual por isso mesmo. Quer um exemplo? A última poesia feita com excrescências do Surrealismo execrado pelos seus parasitas. Nalguns casos é uma sufocada montagem de imagens achadas no cesto dos papéis do Surrealismo. Proclama-se uma renovação morfológica investindo de maior poder a palavra,
O que distingue uma época económica de outra, é menos o que se produziu do que a forma de o produzir.
A heresia de uma época torna-se a ortodoxia da próxima.
Vivemos numa época onde nada é tão indispensável como as coisas supérfluas.
O Universal Opõe-se a Qualquer Época
É admissível que o génio não seja apreciado na sua época porque a ela se opõe; mas pode-se perguntar por que razão é apreciado nas épocas vindouras. O universal opõe-se a qualquer época, pois as características desta são necessariamente particulares; porque será então que o génio, que se ocupa de valores universais e permanentes, é mais favoravelmente recebido por uma época do que por outra?
A razão é simples. Cada época resulta da crítica da época precedente e dos princípios subjacentes à vida civilizacional da mesma. Enquanto que um só princípio está subjacente, ou parece estar subjacente, a cada época, as críticas desse princípio único são variadas, tendo apenas em comum o facto de se ocuparem da mesma coisa. Ao opor-se à sua época, o homem de génio critica-a implicitamente, integrando-se implicitamente numa ou noutra das correntes críticas da época seguinte.
Ele próprio pode produzir uma ou outra dessas correntes, como Wordsworth; pode não produzir nenhuma, como Blake, e contudo viver de acordo com uma atitude paralela à sua, surgida naquela época sem ser por um discipulado propriamente dito.
Quanto mais universal é o génio, mais facilmente será aceite pela época imediatamente a seguir, pois mais profunda será a crítica implícita da sua própria época.
E que me restará… se me desprezar a mim mesmo? Fui ambicioso e não quero absolutamente censurar-me por isso; agi, então segundo as conveniências da época. Agora vivo o dia-a-dia. Mas à vista do mundo, eu me sentiria muito infeliz, se caísse em alguma covardia.
Opiniões Influenciadas pelo Interesse
A maior parte das coisas pode ser considerada sob pontos de vista muito diferentes: interesse geral ou interesse particular, principalmente. A nossa atenção, naturalmente concentrada sob o aspecto que nos é proveitoso, impede que vejamos os outros. O interesse possui, como a paixão, o poder de transformar em verdade aquilo em que lhe é útil acreditar. Ele é, pois, freqüentemente, mais útil do que a razão, mesmo em questões em que esta deveria ser, aparentemente, o guia único. Em economia política, por exemplo, as convicções são de tal modo inspiradas pelo interesse pessoal que se pode, em geral, saber préviamente, conforme a profissão de um indivíduo, se ele é partidário ou não do livre câmbio.
As variações de opinião obedecem, naturalmente, às variações do interesse. Em matéria política, o interesse pessoal constitui o principal factor. Um indivíduo que, em certo momento, energicamente combateu o imposto sobre a renda, com a mesma energia o defenderá mais, se conta ser ministro. Os socialistas enriquecidos acabam, em geral, conservadores, e os descontentes de um partido qualquer se transformam facilmente em socialistas.
O interesse, sob todas as suas formas, não é somente gerador de opiniões. Aguçado por necessidades muito intensas, ele enfraquece logo a moralidade.
Há épocas em que a sociedade, tomada de pânico, se desvia da ciência e procura a salvação na ignorância.
Em uma época de mudanças drásticas, são os que têm capacidade de aprender que herdam o futuro. Quanto aos que já aprenderam, estes descobrem-se equipados para viver em um mundo que não existe mais.
A política foi primeiro a arte de impedir as pessoas de se intrometerem naquilo que lhes diz respeito. Em época posterior, acrescentaram-lhe a arte de forçar as pessoas a decidir sobre o que não entendem.
O Progresso Aumenta a Vida e a Morte
Não desconheço que a velhice constitui, em grande parte, um preconceito aritmético, e que o nosso maior erro consiste em contar os anos que vivemos. Com efeito, tudo nos leva a supor que a Natureza dotou o homem (não falo já nas longevidades da Bíblia) de vida média mais longa do que aquela que as estatísticas demográficas acusam, e que, se morremos antes do termo normal da existência, é porque sucumbimos, não a «morte natural» (a «morte fisiológica», de Metchnickoff), mas a «morte violenta», que é a morte por acção destrutiva dos germes patogénicos. Como quer que seja, porém, parece-me incontestável que o homem envelhece antes do tempo e morre, em geral, quando ainda não chegou a meio do caminho da vida.
Será o engenho humano capaz de opôr uma barreira à marcha inexorável da decrepitude? Talvez. O nosso organismo é uma máquina; gasta-se, como todas as máquinas; e, por milagre da Natureza, ainda é aquela que, funcionando permanentemente, consegue durar mais tempo. Contentemo-nos com a ideia de que o homem de hoje vive mais do que vivia na Antiguidade clássica e na época medieval, mercê do progresso das técnicas, do conforto moderno da existência, da observação dos preceitos que a higiene,
Conselhos a um Príncipe
Vais pela primeira vez ficar com uma responsabilidade. Lembra-te que este primeiro passo na tua vida política, pode decidir de todo o teu futuro. Ouve pois os conselhos de um pai e do teu melhor amigo. Continua o mesmo sistema que tenho sempre seguido, não alardear de querer fazer muito porque então nada se faz, e mesmo tu és apenas um delegado meu por oito a dez dias. Sê modesto sem pareceres ignorante é a primeira qualidade para um príncipe. Trata a todos bem, não dês confianças a ninguém senão aos teus mestres naturais, que deves consultar, porque ninguém nasce ensinado. Desconfia de elogios rasgados, poucas vezes são sinceros. Sê o Carlos meu filho, não queiras nunca parecer mais do que isso, e todos te hão-de estimar e respeitar, porque os desejos e as vontades dos pais são credos para os bons filhos. Não quero senão o teu bem. Ouve-me mais — sobretudo, sê grave, mais ainda que se estivéssemos junto de ti; porque os príncipes se devem distinguir entre todos. Pode-se ser rapaz, divertir-se mas sempre que nos revista um carácter de seriedade que nesta época moderna nos faça reconhecer mais príncipe pelas virtudes e porte do que pela nascença.
Fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade.
A questão portuguesa não é de se falar ou não falar português. É de ser ou não ser à maneira portuguesa, que é ser variadíssimas coisas ao mesmo tempo, e por vezes coisas que parecem contraditórias, e é a possibilidade de tomar um tema e olhar de várias maneiras, conforme o temperamento da pessoa, a época em que viveram, a linguagem de que usavam, a maneira como se sentiam na vida.
A enorme multiplicação de livros, de todos os ramos do conhecimento, é um dos maiores males de nossa época.
Glória Efémera ou Eterna
Via de regra, a glória será tanto mais tardia quanto mais for durável, pois tudo aquilo que é excelente amadurece de maneira lenta. A glória que se tornará póstera assemelha-se a um carvalho que cresce bem lentamente a partir da sua semente; a glória fácil, efémera, assemelha-se às plantas anuais, que crescem rapidamente, e a glória falsa parece-se com erva daninha, que nasce num piscar de olhos e que nos apressamos em arrancar. Esse desenrolar das coisas relaciona-se com o facto de que, quanto mais alguém pertence à posteridade, ou seja, à humanidade geral e inteira, tanto mais estranho será à sua época, pois o que ele produz não é especialmente dedicado a ela como tal, mas só na medida em que a mesma é uma parte da humanidade; logo, as suas obras não são tingidas com a cor local do seu tempo; todavia, em consequência disso, pode acontecer que tal indivíduo passe facilmente como um estranho pela sua época.
Esta prefere apreciar aqueles que tratam os assuntos do seu dia-a-dia ou que servem ao humor do momento, portanto, os factos que pertencem integralmente a ela, que com ela vivem e com ela morrem. Por isso, a história da arte e da literatura ensina geralmente que as mais elevadas realizações do espírito humano,
Nenhuma Época Transmite a Outra a sua Sensibilidade
Nenhuma época transmite a outra a sua sensibilidade; transmite-lhe apenas a inteligência que teve dessa sensibilidade. Pela emoção somos nós; pela inteligência somos alheios. A inteligência dispersa-nos; por isso é através do que nos dispersa que nos sobrevivemos. Cada época entrega às seguintes apenas aquilo que não foi.
Um deus, no sentido pagão, isto é, verdadeiro, não é mais que a inteligência que um ente tem de si próprio, pois essa inteligência, que tem de si próprio, é a forma impessoal, e por isso ideal, do que é. Formando de nós um conceito intelectual, formamos um deus de nós próprios. Raros, porém, formam de si próprios um conceito intelectual, porque a inteligência é essencialmente objectiva. Mesmo entre os grandes génios são raros os que existiram para si próprios com plena objectividade.
Viver é pertencer a outrem. Morrer é pertencer a outrem. Viver e morrer são a mesma coisa. Mas viver é pertencer a outrem de fora, e morrer é pertencer a outrem de dentro. As duas coisas assemelham-se, mas a vida é o lado de fora da morte. Por isso a vida é a vida e a morte a morte, pois o lado de fora é sempre mais verdadeiro que o lado de dentro,
Barbárie: época em que os homens só se matavam um por um.