Passagens sobre Passado

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Frases sobre passado, poemas sobre passado e outras passagens sobre passado para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Não são as palavras que distorcem o mundo, é o medo e a vontade. As palavras são corpos transparentes, à espera de uma cor. O medo é a lembrança de uma dor do passado. A vontade é a crença num sonho do futuro. Não são as palavras que distorcem o mundo, é a maneira como entendemos o tempo, somos nós.

Felicidade Perene e Felicidade Duradoura

Por entre as vicissitudes de uma longa vida, reparei que as épocas das mais doces delícias e dos prazeres mais vivos não são aqueles cuja lembrança mais me atrai e mais me toca. Esses curtos momentos de delíriro e paixão, por mais vivos que possam ter sido, não são, no entanto, e até pela sua própria intensidade, senão pontos bem afastados uns dos outros na linha da minha vida. Foram demasiados raros e demasiado rápidos para constituírem um estado, e a felicidade de que o meu coração sente saudades não é constituída por instantes fugidios, é antes um estado simples e permanente que em si mesmo não tem vivacidade, mas cuja duração aumenta o seu encanto ao ponto de nele encontrar finalmente a felicidade suprema.
Na terra, tudo vive num fluxo contínuo. Nada conserva uma forma constante e segura, e as nossas afeições, que se prendem às coisas exteriores, passam e, como elas, mudam. Sempre à nossa frente ou atrás de nós, elas lembram o passado que já não existe, ou prevêem o futuro que muitas vezes não será: não existe nada de sólido a que o coração possa prender-se. É por isso que, na terra, só existe prazer passageiro;

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Um homem sem memória é um homem sem passado. Mas um homem que não sabe fantasiar é um homem sem futuro.

É Possível Estarmos Todos Errados?

É possível (…) que não se tenha visto, conhecido e dito nada de real e importante? É possível que se tenha tido milénios para olhar, reflectir e anotar e que se tenha deixado passar os milénios como uma pausa escolar, durante a qual se come fatias de pão com manteiga e uma maçã?
Sim, é possível.
É possível que, apesar das investigações e dos progressos, apesar da cultura, da religião e da filosofia, se tenha ficado na superfície da vida? É possível que até se tenha coberto essa superfície – que, apesar de tudo, seria qualquer coisa – com um pano incrivelmente aborrecido, de tal modo que se assemelhe aos móveis da sala durante as férias de Verão?
Sim, é possível.
É possível que toda a História Universal tenha sido mal-entendida? É possível que o passado seja falso, precisamente porque sempre se falou das suas multidões, como se dissertasse sobre uma aglomeração de pessoas, em vez de falar de uma única, em torno da qual elas estavam, porque se tratava de um desconhecido que morreu?
Sim, é possível.
É possível que se tenha julgado ser preciso recuperar o que aconteceu antes de se ter nascido?

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Fímbria de Melancolia

Fímbria de melancolia,
memória incerta da dor,
ouço-a no gravador,
no fado que não se ouvia
quando ouvia o seu clamor.

Porque era já no passado
o presente dessa hora
e que me ressoa agora
a um outro mais alongado.

Assim a dor que se sente
no outro obscuro de nós
nunca fala a nossa voz
mas de quem de nós ausente,
só a nós próprios consente
quando não estamos nós
mas mais sós do que ao estar sós.

Onde então estamos nós?

A Torpe Sociedade onde Nasci

I

Ao ver um garotito esfarrapado
Brincando numa rua da cidade,
Senti a nostalgia do passado,
Pensando que já fui daquela idade.

II

Que feliz eu era então e que alegria…
Que loucura a brincar, santo delírio!…
Embora fosse mártir, não sabia
Que o mundo me criava p’ra o martírio!

III

Já quando um homenzinho, é que senti
O dilema terrível que me impôs
A torpe sociedade onde nasci:
— De ser vítima humilde ou ser algoz…

IV

E agora é o acaso quem me guia.
Sem esperança, sem um fim, sem uma fé,
Sou tudo: mas não sou o que seria
Se o mundo fosse bom — como não é!

V

Tuberculoso!… Mas que triste sorte!
Podia suicidar-me, mas não quero
Que o mundo diga que me desespero
E que me mato por ter medo à morte…

Saudade

Segue-me noite e dia o teu desejo!…
Oiço a tua voz rúbida e cantante
Suplicar-me a carícia do meu beijo,
numa teima exigente e perturbante!

E o meu corpo vencido, dominado,
vai tombar doloroso, inconsciente,
sobre a lembrança morna do passado
– e fica-se a sonhar… perdidamente!

A Importância de Dostoievski na Literatura

Os dois grandes monumentos do romance que o século passado (XIX) nos legou, ou seja aqueles em que poderemos reconhecer-nos, foram os erguidos por Tolstoi e por Dostoievski. Mas se a lição do primeiro foi facilmente assimilada, a do segundo levou tempo – e tanto, que só hoje acabámos de entendê-la bem. Significa isto que Tolstoi, com incidências menores de moralização, continua um Balzac, é bem do século XIX. E foi por se pretender à força ligar a esse século também um Dostoievski que ele só tarde se nos revelou, para dominar ainda hoje, diga-se o que se disser, todo o romance europeu. Para usar uma expressão que já usei, não com inteira originalidade, e a que a crítica me ligou, direi que Tolstoi continua o romance-espectáculo e que Dostoievski inaugura o romance-problema.

Dir-se-ia, e com razão, que todo o romance é problema e espectáculo, já que o espectáculo resiste num romance de Kafka ou Dostoievski, e o problema implicita-se numa qualquer narrativa, nem que seja o Amadis de Gaula. Mas é tão visível a deslocação do acento na obra de Dostoievski, que ela foi defendida, para existir, pelo que lhe é inessencial (como por um Brunetière e recentemente um Ernst Fischer,

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As pessoas mais interessantes são os homens que têm futuro e as mulheres que têm passado.

Realidade

Sim, passava aqui frequentemente há vinte anos…
Nada está mudado — ou, pelo menos, não dou por isto —
Nesta localidade da cidade…

Há vinte anos!…
O que eu era então! Ora, era outro…
Há vinte anos, e as casas não sabem de nada…

Vinte anos inúteis (e sei lá se o foram!
Sei eu o que é útil ou inútil?)…
Vinte anos perdidos (mas o que seria ganhá-los?)

Tento reconstruir na minha imaginação
Quem eu era e como era quando por aqui passava
Há vinte anos…
Não me lembro, não me posso lembrar.

O outro que aqui passava, então,
Se existisse hoje, talvez se lembrasse…
Há tanta personagem de romance que conheço melhor por dentro
De que esse eu-mesmo que há vinte anos passava por aqui!

Sim, o mistério do tempo.
Sim, o não se saber nada,
Sim, o termos todos nascido a bordo
Sim, sim, tudo isso, ou outra forma de o dizer…

Daquela janela do segundo andar, ainda idêntica a si mesma,
Debruçava-se então uma rapariga mais velha que eu,

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Assuntos Mortais e Assuntos Imortais

Com um pouco mais de deliberação na escolha dos seus objectivos, possivelmente todos os homens se tornariam em essência estudiosos e observadores, porque a natureza e o destino de cada um interessam sem dúvida de igual maneira a todos. Ao acumular bens para nós ou para os nossos descendentes, ao fundar uma família ou um estado, ou ainda ao alcançar a fama, somos mortais; mas ao lidarmos com a verdade somos imortais e não precisamos de temer mudanças ou acidentes.
O mais antigo filósofo egípcio ou hindu levantou uma ponta do véu que cobria a estátua da divindade; essa trémula túnica ainda permanece levantada, e eu contemplo uma glória tão fresca como a que contemplou o filósofo, já que era eu nele quem se mostrou tão audacioso naquela época, e é ele em mim quem agora volta a observar a visão. Nenhuma poeira se depositou sobre essa túnica; tempo nenhum decorreu desde que tal divindade se viu revelada. O tempo que aproveitamos realmente, ou que é aproveitável, não é passado, nem presente, nem futuro.