Evocação
Levanta-te Romeu do tĂșmulo em que dormes
E vem sorrir de novo Ă boa, Ă eterna luz!
De noite, ouço dizer que hå sombras desconformes
E as noites do passado, oh, devem ser enormes
Na atonia fatal das larvas e da cruz!Conchega gentilmente ao peito carcomido
Os restos do teu manto: â assim, que bem que estĂĄs!Na terra hĂŁo de julgar-te um grande Aborrecido
Que busca desdenhoso o centro do ruĂdo
Nas horas vis do tedio e das insonias mĂĄs.O mundo transformou-se; aquele fundo abismo
Do antigo amor fatal, fechou-se d’uma vez,
E tu filho gentil do velho romantismo,
Tu vens achar dormindo o rude prozaismo
No berço onde sonhava a doce candidez!No entanto pódes crer; faz muito menos frio
Ă luz do novo sol; do gaz provocador;
E o século apesar de gasto e doentio,
NĂŁo pode jĂĄ escutar o cĂąntico sombrio
Que fala de edeaes e cousas sem valor!Em paz deixa dormir a terna Julieta
Que aos céus ainda por ti levanta as brancas mãos;
E enquanto por mim corre a tétrica ampulheta,
Da musa alegre e vil da torpe cançoneta
Saudemos a nudez a par dos bons pagĂŁos!Nas praças, tu bem vĂȘs; a turba prazenteira
Inunda-se na luz de mil constelaçÔes!
E os arcanjos da rua assomam na poeira
Que exala o macadame, trazendo em cada olheira
O astro criador das grandes sensaçÔes!E quando a cotovia à estrela matutina
Mandar a saudação, lå fora, em pleno céu,
Romeu tu beijarĂĄs, que Ă© tua eterna sina,
A trança da beleza anémica e franzina
Que entre os fumos da festa, a amar, adormeceu!