Meditar não é outra coisa que cuidar um homem no que lhe importa ou deseja e nenhum há que não medite.
Passagens sobre Homens
7018 resultadosA Castração da Personalidade
O homem é um animal gregário. Político, dizia Aristóteles, ou seja, membro da cidade. Mas não só da cidade – de todas as greis espontâneas ou artificiais, estáveis ou precárias, onde quer que se encontre. Não pode suportar a ideia de estar só, consigo – quer ser unidade e não individualidade. Tem necessidade de se sentir cotovelo com cotovelo, pele com pele, no calor de uma multidão, ligado, seguro, uniforme, conforme. Se o leão anda só, em nós predomina o instinto ovino, do rebanho – os próprios individualistas, para afirmar o seu individualismo, congregam-se: sempre segundo a prática ovina.
O homem, quando só, sente-se incompleto – tem medo. Opor-se à grei significa separar-se, permanecer só, morrer. Os conceitos do bem e do mal nascem da necessidade de convivência. É bem o que aproveita ao grupo, mal o que o prejudica ou não beneficia. O rebanho não quer que cada ovelha pense demasiado em si, e como a privilegiada é a que obtém a boa opinião das outras, vê-se forçada, ainda que contra os seus gostos e interesses, a agir no sentido do bem supremo do rebanho. Há que pagar, com a castração da personalidade, a segurança contra o medo.
Um homem bem-educado jamais fere os sentimentos das outras pessoas… sem querer.
Não há normas. Todos os homens são excepção a uma regra que não existe.
O Homem não é um Ser Egoísta
Todos os homens estão prontos a morrer pelo que amam. Não diferem a não ser pelo grau da coisa amada e da concentração ou dispersão do amor. Ninguém se desama a si mesmo. O homem deseja ser egoísta e não consegue. É a característica mais tocante da sua desgraça e a fonte da sua grandeza.
O homem dedica-se sempre a uma ordem. No entanto, salvo iluminação sobrenatural, esta ordem tem como núcleo o próprio ou um ser particular (que pode ser uma abstracção) para o qual se transferiu (Napoleão para os soldados, a Ciência, o Partido, etc.). Ordem perspectiva.
O Monstro Incompreensível
É perigoso mostrar ao homem até que ponto se assemelha aos animais sem lhe mostrar a sua grandeza. Também é perigoso mostrar-lhe muito a grandeza sem a baixeza. É ainda mais perigoso deixá-lo ignorar uma e outra. Mas é muito vantajoso representar-lhe as duas.
O homem não é anjo nem besta, e por desgraça quem quer ser anjo acaba por ser besta.
Se se exalta, humilho-o; se ele se humilha, exalto-o: e contradigo-o sempre, até que ele compreenda que é um monstro incompreensível.
Condeno igualmente os que tomam o partido de louvar o homem, e os que tomam de o condenar, e os que tomam o de se divertir; e não posso aprovar senão aqueles que buscam gemendo.
A Liberdade de Escolha
Realmente, se um dia de facto se descobrisse uma fórmula para todos os nossos desejos e caprichos – isto é, uma explicação do que é que eles dependem, por que leis se regem, como se desenvolvem, a que é que eles ambicionam num caso e noutro e por aí fora, isto é uma fórmula matemática exacta – então, muito provavelmente, o homem deixaria imediatamente de sentir desejo.
Pois quem aceitaria escolher por regras? Além disso, o ser humano seria imediatamente transformado numa peça de um orgão ou algo do género; o que é um homem sem desejos, sem liberdade de desejo e de escolha, senão uma peça num orgão?
A Felicidade
A felicidade é um estado permanente que não parece ter sido feito, aqui na terra, para o homem. Na terra, tudo vive num fluxo contínuo que não permite que coisa alguma assuma uma forma constante. Tudo muda à nossa volta. Nós próprios também mudamos e ninguém pode estar certo de amar amanhã aquilo que hoje ama. É por isso que todos os nossos projectos de felicidade nesta vida são quimeras.
Aproveitemos a alegria do espírito quando a possuímos; evitemos afastá-la por nossa culpa, mas não façamos projectos para a conservar, porque esses projectos são meras loucuras. Vi poucos homens felizes, talvez nenhum; mas vi muitas vezes corações contentes e de todos os objectos que me impressionaram foi esse o que mais me satisfez. Creio que se trata de uma consequência natural do poder das sensações sobre os meus sentimentos. A felicidade não tem sinais exteriores; para a conhecer seria necessário ler no coração do homem feliz; mas a alegria lê-se nos olhos, no porte, no sotaque, no modo de andar, e parece comunicar-se a quem dela se apercebe.
É felicidade para os homens que cada um deles a defina a seu modo com variedade, na sua essência e objectos.
Não há espelho que melhor reflita a imagem do homem do que de suas palavras.
O homem mais poderoso é aquele que pode dispor da sua própria energia.
Mesmo que envolvamos um diamante com lama e imundícies, ele próprio não se macula. O diamante permanece limpo e puro sob a sujeira. O que está sujo é apenas a sujeira. Assim também é a essência espiritual do ser humano: por mais que o homem se envolva com pecados, jamais fica maculado; apenas encobre sua natureza verdadeira. É isto que queremos dizer quando afirmamos que ‘neste mundo não há um pecador sequer’. Na verdade, o que é pecaminoso é unicamente o pecado e não o ser verdadeiro, isento de pecado.
Na verdade, os homens ofendem ou por medo ou por ódio
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.
Homens que querem ajudar as mulheres em nossa luta por liberdade e justiça deviam compreender que não é extraordinariamente importante para nós que eles aprendam a chorar; é importante para nós que eles parem os crimes de violência contra nós.
Existem três coisas no mundo, dizia o sábio Sócrates,
que afugentam o homem e fazem-no sair de casa:
o fogo, o fumo e uma mulher má.
O Asco da Imprensa
É impossível percorrer uma qualquer gazeta, seja de que dia for, ou de que mês, ou de que ano, sem aí encontrar, em cada linha, os sinais da perversidade humana mais espantosa, ao mesmo tempo que as presunções mais surpreendentes de probidade, de bondade, de caridade, a as afirmações mais descaradas, relativas ao progresso e à civilização.
Qualquer jornal, da primeira linha à última, não passa de um tecido de horrores. Guerras, crimes, roubos, impudicícias, torturas, crimes dos príncipes, crimes das nações, crimes dos particulares, uma embriaguez de atrocidade universal.
E é com este repugnante aperitivo que o homem civilizado acompanha a sua refeição de todas as manhãs. Tudo, neste mundo, transpira o crime: o jornal, a muralha e o rosto do homem.
Não compreendo que uma mão pura possa tocar num jornal sem uma convulsão de asco.
Um homem pode morrer, uma nação se erguer ou cair, mas uma idéia vive sempre.
Há hoje quem esteja plenamente convencido de que nasceu mais engenheiro do que homem; como se já estivéssemos naquele tempo de pesadelo em que se fabricariam homens-máquinas de servir máquinas de servir homens-máquinas.
Os homens não amam o que cuidam que amam.